quinta-feira, 27 de outubro de 2011

A LATINHA DE LEITE




Um fato real.

Dois irmãozinhos maltrapilhos, provenientes da favela, um deles de cinco anos e o outro de dez, iam pedindo um pouco de comida pelas casas da rua que beira o morro.
Estavam famintos:
‘vai trabalhar e não amole‘, ouvia-se detrás da porta; ‘aqui não há nada moleque...‘, dizia outro...
As múltiplas tentativas frustradas entristeciam as crianças...
Por fim, uma senhora muito atenta disse-lhes ‘vou ver se tenho alguma coisa para vocês...
Coitadinhos!‘ e voltou com uma latinha de leite.
Que festa! Ambos se sentaram na calçada.
O menorzinho disse para o de dez anos ‘você é mais velho, tome primeiro...‘
E olhava para ele com seus dentes brancos, a boca semi-aberta, mexendo a ponta da língua. Eu, como uma tola, contemplava a cena...
Se vocês vissem o mais velho olhando de lado para o pequenino!
Leva a lata à boca e, fazendo gesto de beber, aperta fortemente os lábios para que por eles não penetre uma só gota de leite.
Depois, estendendo a lata, diz ao irmão ‘agora é sua vez. Só um pouco.‘
E o irmãozinho, dando um grande gole exclama ‘como está gostoso!‘ ‘agora eu‘, diz o mais velho.
E levando a latinha, já meio vazia, à boca, não bebe nada.
‘agora você‘, ‘agora eu‘, ‘agora você‘, ‘agora eu‘...
E, depois de três, quatro, cinco ou seis goles, o menorzinho, de cabelos encaracolado, barrigudinho, com a camisa de fora, esgota o leite todo...
Ele sozinho. Esse ‘agora você‘, ‘agora eu‘ encheram-me os olhos de lágrimas...
E então, aconteceu algo que me pareceu extraordinário.
O mais velho começou a cantar, a sambar, a jogar futebol com a lata de leite.
Estava radiante, o estômago vazio, mas o coração trasbordante de alegria.
Pulava com a naturalidade de quem não fez nada de extraordinário, ou melhor, com a naturalidade de quem está habituado a fazer coisas extraordinárias sem dar-lhes maior importância.
Daquele moleque nós podemos aprender a grande lição, ‘quem dá é mais feliz do que quem recebe.‘
É assim que nós temos de amar.
Sacrificando-nos com tal naturalidade, com tal elegância, com tal discrição, que os outros nem sequer possam agradecer-nos o serviço que nós lhe prestamos."



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